Os concursos têm sido cada vez mais difíceis, é fato. Tanto a quantidade/variedade das disciplinas, quanto a abrangência e a profundidade dos conteúdos têm sido maiores.
Fazendo uma análise “histórica” dos concursos públicos, temos momentos bastante distintos. Antes de 1988, o acesso à administração pública se dava por meio de indicação. Ou era alguém influente ou amigo do amigo. Daí a expressão que se usava à época de “cabide de empregos”. Claro, quem entrava não era necessariamente competente e também não tinha o compromisso de realizar um bom trabalho. Queria tão somente usufruir o salário. Assim, não se tinha também muito orgulho em ser funcionário público. As pessoas sérias tinham até alguma vergonha.
Mesmo antes de 88, alguns órgãos realizavam concursos para contratação de seus funcionários. Não era difícil ser aprovado, porque não existia ainda a cultura do concurso. Havia um temor de que o processo não fosse sério, que servisse apenas para dar uma aparência de lisura a indicações previamente feitas. Poucas pessoas se candidatavam e o nível de exigência não era tão elevado. Eu mesma, aos 18 anos, prestei alguns concursos. Não estudei muito, apenas li algumas apostilas. Era muito nova e não tinha certeza de que queria mesmo aquilo, nem de que não seria um “jogo de cartas marcadas”. Fui aprovada em todos, alguns em melhor colocação, outros mais para o fim da fila. Está certo que tinha acabado de fazer vestibular, era jovem e estava com o cérebro bastante afiado.
Após a exigência constitucional (1988) de ingresso na carreira pública por meio de concurso, os funcionários antigos foram naturalmente sendo substituídos por concursados. Mas os concursos ainda eram relativamente simples. Tinham como objetivo exigir o grau de escolaridade necessário e separar os mais bem capacitados entre os candidatos. Cabia à Administração, posteriormente, a qualificação dos servidores, no dia a dia de trabalho. As funções não eram tão complexas e, portanto, bastava que o aprovado tivesse condições de aprender. Nessa época, conviviam funcionários que simplesmente “penduravam o paletó” e outros que chegavam com uma postura nova, mais comprometida. Uns contaminavam os outros e nem sempre, infelizmente, os melhores valores prevaleciam.
Com o passar dos anos, a Administração Pública foi-se sofisticando. O uso de novas tecnologias, a modernização dos procedimentos, a exigência da ética na realização das tarefas pelo agente público criaram a necessidade de concursos mais específicos. Por outro lado, o instituto concurso público foi ganhando credibilidade. As pessoas estudavam e conquistavam a vaga. Os salários cada vez mais atraentes, um mercado privado desencorajador e a perspectiva de segurança foram atraindo cada vez mais pessoas. Quase todo mundo hoje conhece alguém que se preparou e tornou-se um servidor público. Os concursos passaram a mover uma parcela significativa da economia, entre bancas examinadoras, cursos preparatórios e editoras especializadas, para falar o mínimo. Ganharam notoriedade na mídia e estão na “ordem do dia” todos os dias, ao lado das notícias de momento. A quantidade de candidatos a cada vaga é cada vez maior.
Em consequência, aconteceu um fato curioso: o Estado (lato sensu) descobriu que pode, além de escolher os mais capacitados, exigir que estejam plenamente qualificados para o exercício de sua função pública. Assim, os editais passaram a exigir conhecimentos profundos, específicos, relativos a cada cargo oferecido. Os interessados, obrigatoriamente, tiveram de profissionalizar seu estudo para dar conta do novo padrão de provas a ser enfrentado. Fazer concurso hoje é algo natural como cursar uma faculdade ou fazer uma pós-graduação. Faz parte do elenco de opções de ingresso no mundo produtivo. Projeto sério e de médio prazo, alternativa para adultos de qualquer idade.
Atualmente, ser servidor público é sinônimo de status no melhor sentido da palavra: é alguém que se empenhou e conquistou por mérito um trabalho de qualidade. Por tudo isso e cada dia mais, a administração pública vem-se transformando com a chegada periódica de gente bem preparada, com conhecimentos atualizados mas também, e principalmente, pelo ingresso de pessoas comprometidas, que percorreram uma árdua trajetória para conquistarem a sua vaga. Hoje, é com orgulho que preencho o campo “profissão”: servidora pública.